Uma Noite de Crime


- Lawless -

A premissa de Uma Noite de Crime carrega consigo certa dualidade intrigante; pois ao mesmo tempo que parece inteligentíssima a ideia de um período onde -dentro da sociedade como um todo, e não de um concurso, como nos Jogos Vorazes- a barbárie se torna válida, o mesmo não se pode dizer do setup escolhido para estabelecer a trama. A história do ‘lar pacato da família americana sendo brutalizado por psicopatas’ é quase tão velha quanto o próprio cinema de horror, e especialmente neste aqui, em nada ajuda as aspirações distópicas e provocadoras do roteiro. O produto final acaba sendo um suspense fajuto, diluído de tantas ideias grandiosas.

Aparentemente, o maior problema do filme de James DeMonaco é certa covardia que faz o diretor não prosseguir com o poderoso comentário social que o primeiro terço de seu filme rende. Para que serve a noite de purgação? A sociedade tem prosperado, mas quem realmente ganha algo com isso? Como as pessoas aprovaram a criação de tal evento? Tantas e tão amplas questões aguardam ansiosas para serem respondidas, enquanto o roteiro se afunila mais e mais na rua, na casa, no elemento humano que, infelizmente, não tem muita coisa a dizer.

O foco da história, escrita pelo próprio DeMonaco, é a família Sandin, que achou prosperidade vendendo sistemas de segurança para famílias abastadas. Hawke e Headey formam um casal gélido, quase caricato, e os jovens atores que interpretam seus filhos não ajudam muito na criação de alguma empatia -pelo contrário, os jovens tem algumas das atitudes mais imprudentes e irritantes da ficção nos últimos tempos. Na noite da purgação, o filho pequeno se compadece de um rapaz prestes a ser abatido e permite que ele entre na fortaleza da família. A partir daí as coisas ficam um tanto confusas, com o filme não se decidindo entre trabalhar a maneira pouco orgânica com a qual o patriarca se transfigura em vigilante e empreende uma caçada ao intruso, ou dar atenção ao estranho grupo, de aparência e discurso amplamente preconceituoso, que não poupa esforços para invadir a casa e matar qualquer um que lá estiver, em busca de seu alvo.

De toda a má-formação, os melhores momentos talvez sejam aquele em que um Hawke, aflito para acalmar sua família, tenta assegurá-los de que a noite terminará bem, apesar de toda a turbulência, o que sua filha mais velha rebate apocalipticamente, dizendo que ‘nada vai ficar bem outra vez’. Como diz um senhor nos créditos finais ‘não tenho mais orgulho de ser um americano, a América me tirou tudo'; talvez seja a esse sentimento que a moça se refere, e que fica tão claro nos momentos finais, onde o futuro parece oferecer apenas um punhado mais de destruição.

Uma Noite de Crime (★★)
James DeMonaco, Estados Unidos/França, 2013

IMDB ROTTEN KRITZ FILMOW